terça-feira, 8 de dezembro de 2015

X Mostra Cinema e Direitos Humanos conduz o debate para a cozinha

   
Zelita e Jeanne 
Há semelhanças entre a realidade e a ficção em "Do outro lado da cozinha" e "Que horas ela volta?". Este último, dirigido por Ana Muylaert, deriva do primeiro documentário. 
Os dois filmes são produções nacionais, sendo que o de ficção estrelado por Regina Casé concorre ao Oscar 2016 como filme estrangeiro, e "Do outro lado..." esteve na programação da 10ª Mostra Cinema e Direitos Humanos, em cartaz no cine Praia Grande até quarta-feira,9, em São Luís. Tratam sobre um tema comum: a empregada doméstica e suas agruras históricas. A divulgação foi subterrânea, limitada à rede.
     A mostra organizada pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República objetiva suscitar o debate sobre direitos humanos e suas vértices. Pena que na exibição do documentário no Praia Grande, pelo menos na secção da mostra, o público tenha sido pequeno, formado por uma platéia de estudiosos e interessados nos temas enfocados. Menos ainda, eram aqueles realmente enredados pelos temas. Enfim, os protagonistas de verdade, no sentido do segmento tratado em cada filme da mostra, nem tomaram conhecimento.
     "Do outro lado da cozinha" é anterior ao e-social. O filme que concorre ao Oscar, apesar de contemporânea às recentes conquistas trabalhistas dos domésticos, não evidencia no enredo o estabecimento das garantias da lei. 
    No debate após a exibição do documentário a diretora do Sindicato estadual dos empregados domésticos, a quilombola guimarense Maria Isabel confirmou a existência da confusão seletiva gerada pela pseu-relação de amizade entre famílias e domésticas. Na sequência do debate, a assesora da Secretaria de Estado da Igualdade Racial, Seir, Marinildes Martins, focou na  recorrente situação de escravidão para concluir: "Só quem é negro sabe o que é preconceito". 
     Marildes pe assessoria de ações afirmativas do governo Flávio Dino. No registro de candidato do governador apresentado ao Tribunal Superior Eleitoral  nas eleições de 2014 no espaço Cor\Raça está lá, Branca. A crença da assessora no governador é, portanto, uma exceção no seu pensamento.  Na sua postura aguerrida, a assessora usou até a palavra "ódio" para reprovar a situação apresentada no filme, que embora documentário pertence ao campo da arte.

    Os dois filmes mostram como a situação da empregada doméstica explorada, sem direito à vida comunitária, extraída de seu ambiente social legítimo, geralmente nos primeiros anos de vida, para viver à deriva, a reboque de uma realidade emprestada que jamais lhe absorverá, mas a consome integralmente.
    Dirigido por Jeanne Dosse, "Do outro lado da cozinha" conta história da empregada de uma família que se transfere para Paris e deixa para trás o rastro da história de Zelita Sevilha da Silva, resgatada para reviver um passado ainda presente em lares do país.
     Em uma passagem do filme, Zelita conta que jamais se sentou à mesa dos patrões nas refeições. Isso acontecia apenas em eventos públicos, em restaurantes. Por outro lado, a relação afetiva entre a "mãe preta" e os filhos da boa patroa que contribui com o sonho da casa própria tem a pureza fraternal. Essa passagem foi realçada pela sindicalista.
      A mão de obra escrava que ainda perdura na cozinha brasileira  é negra como Zelita e Maria Isabel. Os filmes contribuem para o debate. No entanto, está na política real o passo mais concreto para reverter situações ainda vexatórias para a sociedade brasileiro.  Um exemplo disso foi o depoimento de uma telespectadora argentina que relatou sua experiência em Fortaleza sendo hóspede de uma família que replica a relação obsoleta entre patrões e empregados domésticos. Isso não é somente questões de negros, mas de toda sociedade, inclusive dos governantes.